A ver uma série de televisão norte-americana, assisti a uma cena que, muito simplesmente, retratava aquela idade chata dos putos - a "idade dos porquês". E, como o meu cérebro é algo que não pára, comecei a pensar no futuro, quando um dia tiver criaturas pequenas e irritantes a atravessar esta fase tão importante da vida.
Quem me conhece, dificilmente me imagina com paciência para aturar tanta questão. E a bem ver, eu próprio não me consigo imaginar a contar a história da cegonha que vem de Paris ou da semente que o paizinho colocou na mamã. Na minha cabeça, durante os breves instantes em que me debrucei sobre o assunto, surgiram dois cenários óbvios e lógicos: ou a mamã tem essa paciência e vai estar sempre presente na altura dos porquês ou o puto está, literalmente, tramado. Digo isto porquê? Porque eu sou um inventor de histórias, não sou mentiroso, sou inventor. Tenho um personagem ou um tema e consigo inventar uma história mirabolante à volta disso. Já testei várias vezes, em situações completamente irrisórias e o resultado é sempre o mesmo: uma história mirabolante.
Pobres crianças quando me questionarem sobre o porquê de terem de comer a sopa ou lavar os dentes. Ou então o porquê de estarem trancados no armário enquanto o pai e mãe vão jantar fora. É certo que irei contar a verdade às vezes mas desde dinossauros a esquilos-voadores, vão ouvir um pouco de tudo.
- Papá, não quero mais sopa! Tenho de comer toda porquê?
- Ainda bem que perguntas, Xiquinho. Lembras-te da menina do quiosque onde o pai vai comprar o jornal que depois não lê? É bonita, não é? Pois, a mamã era tão bonita quanto ela mas um dia não comeu a sopa e agora é feia e gorda. O papá comeu sempre a sopa e agora é um cavalheiro elegante. Percebes?
- Papá, papá. O céu é azul, porquê?
- Ainda bem que perguntas, Xiquinho. Quando o papá nasceu, o céu não tinha cor. E então o papá foi falar com o dono do mundo para o céu ter cor. O dono do mundo não quis ouvir o papá e para provocar o papá, tornou o céu preto, e todos os meninos olhavam para o céu e ficavam tristes. Então o papá foi novamente ter com o dono do mundo mas desta vez levou um pau. E o dono do mundo quis ser mau mas o papá usou o pau e bateu no dono do mundo, que depois chamou os amigos para baterem no papá mas o papá encontrou uma espada e cortou os maus ao meio. Entretanto apareceram esquilos-voadores que cuspiam fogo e tentaram fazer mal ao papá mas o papá transformou-se em super-guerreiro e com um kamehame em forma de noz transformou todos os esquilos-voadores em seres fofinhos. Mas o céu estava a ser engolido por um buraco negro e um Deus disse que só o "escolhido" podia salvar o céu e o papá teve de entrar no buraco negro, onde nunca ninguém tinha entrado, e entrou, e entrou, e foi até ao fundo, conduziu um descapotável, namorou com sereias, lutou contra tigres e conseguiu recuperar o céu! Depois, o papá perguntou a todos os meninos do mundo qual era a cor que queriam. Mas como o papá encontrou muitas meninas, democraticamente o céu devia ser rosa ou verde-turquesa. E então, o papá decidiu dar ao céu a cor dos teus olhos Xiquinho, para sempre que olhes para o céu saberes que o papá gosta muito de ti, mesmo quando te mete de castigo.
- Mas papá, os meus olhos são castanhos.
- Pois... queres ir comer um gelado?
Pobre gaiato, pobre gaiato...